"A prestação do patrocínio forense não era a mesma coisa que o fabrico de bolas de Berlim ou a produção de alheiras"
António Marinho Pinto in "Um combate desigual", Verso de Kapa, 2010, p.46

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Cronologia de um Estágio.




Eu sei, eu sei, Marinho...
As palavras não chegam para justificar a minha ausência. Poderia falar em trabalho, preguiça, desmotivação, excesso de temas, mas nada disso seria suficiente. Receio que a minha noção de tempo esteja a começar a adaptar-se aos padrões da Ordem dos Advogado e que aquilo que me parecem 15 dias na verdade sejam 6 meses.
Mas, não é tarde nem é cedo, por isso cá vai:

Boa noite, Marinho.

Venho falar-te do I Curso de Estágio de 2011 (não falarei, para já, do II Curso de 2011 que, por sinal, começou em 2012, nem falarei daquele absurdo a que chamas exame de agregação e cujas notas foram publicadas ontem, mas lá chegarei).
Começarei por te apresentar uma breve cronologia do que aconteceu na vida de um Advogado-Estagiário licenciado em Julho de 2010 que pretendeu, ingenuamente, ingressar na Ordem dos Advogados naquele ano, tendo acreditado que te pautavas pelo Estatuto da Ordem dos Advogados e que irias abrir os dois cursos a que estavas legalmente obrigado.

Julho de 2010: Conclusão da licenciatura.
Setembro de 2010: Início do estágio e preenchimento do formulário da pré-inscrição de Advogado-Estagiário no site do Conselho Distrital respectivo.
Outubro/Novembro de 2010: Anúncio da abertura do I Curso de Estágio de 2010 agendado para 13 de Dezembro de 2010.
Dezembro de 2010: Adiamento da abertura do Curso de Estágio para 25 de Janeiro de 2011.
Janeiro de 2011: Acórdão do Tribunal Constitucional a declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do exame que decidiste criar para barrar a entrada na OA.
Retaliação tua traduzida no adiamento da abertura do Curso de Estágio para 15 de Março de 2011.
15 de Março de 2011: Início do curso de estágio. Emolumentos no valor de 150€ relativos à 1.ª fase do estágio já pagos por parte dos Advogados-Estagiários.
30 de Março de 2011: Anúncio de que os Advogados-Estagiários já inscritos terão, afinal, de pagar mais 650€ pela 1.ª fase do estágio, apesar de a mesma já estar paga, até 30 de Junho de 2011. Quem tem dinheiro que pague, quem não tem não entra.
1 de Julho de 2011: Prorrogação do prazo de pagamento dos emolumentos que já terminara para dia 8 de Julho.
- Marcação dos exames da 1.ª fase para os dias 18, 20 e 22 de Julho. Exames ao dobro das disciplinas a ocorrer no espaço de uma semana num total de 5 horas a cada dia alternado (2.ª, 4.ª e 6.ª).
18, 20 e 22 de Julho de 2011: Realização dos exames de aferição. Nos termos do art. 16.º do Regulamento da Comissão Nacional de Avaliação, os resultados deveriam estar publicados no prazo de 30 dias, isto é, no dia 23 de Agosto de 2011.
13 de Outubro de 2011: Publicação das notas. Início do processo de interposição de recurso das classificações por parte dos Advogados-Estagiários.
24 de Outubro de 2011: Publicação de novos critérios de correcção em virtude de a Ordem dos Advogados ter reconhecido a existência de erros nos anteriores.
8 de Novembro de 2011: Fim do prazo para requerer a revisão da prova. Nos termos do art. 20.º do Regulamento da Comissão Nacional de Avaliação, os pedidos de revisão deverão estar decididos no prazo de 15 dias.
6 de Fevereiro de 2012: Publicação dos resultados dos pedidos de revisão. Quem passou avança para a 2.ª fase, quem chumbou está no mesmo ponto em que estava quando se inscreveu, mas mais pobre. Resta-lhe repetir o exame.
Nos termos do art. 23.º, n.º 3 do Regulamento Nacional de Estágio a repetição do exame de acesso tem carácter urgente.
28 de Março de 2012: Marcação dos exames de aferição relativos ao II Curso de Estágio de 2011 (o tal que começou em 2012). Por telefone os Conselhos Distritais informam que os Advogados-Estagiários que chumbaram no exame de Julho de 2011 terão de repetir o exame juntamente com os Advogados-Estagiários do novo Curso. Não há carácter de urgência.
30 de Abril, 2 e 4 de Maio de 2012: Realização dos exames de repetição. Resta esperar.

Nota: Dependendo do Conselho Distrital do Advogado-Estagiário em causa (pois isto varia de um para outro), caso o mesmo não tenha podido pagar os emolumentos que fixaste com efeito retroactivo e tenha sido forçado a abandonar o I Curso de Estágio de 2011, então, para se poder inscrever no II Curso de Estágio de 2011, esse Advogado-Estagiário terá de pagar, não só os 650€ referentes ao 1.º Curso, como ainda os 700€ relativos ao II Curso e ainda o valor de 75€ relativo ao levantamento da suspensão da inscrição.
Como é que tu dizias no preâmbulo da tua Deliberação n.º 2597/2009? Aquela que aprovaste em campanha eleitoral e que nunca chegou a vigorar?
Acho que era assim:
Considerando que o acesso ao estágio da Advocacia não deve estar condicionado pelas limitações de ordem económica actualmente existentes

Abraço,

L.O.

sábado, 1 de outubro de 2011

The strange case of Dr. Marinho and Mr. Pinto




Olá Marinho,

Venho cá só para te colocar uma breve questão: afinal qual é a tua posição quanto às acções contra o Estado no que respeita à reclamação dos honorários em atraso dos advogados oficiosos?

É que recentemente disseste, perante uma plateia de 600 advogados, que: "Vamos tomar ações judiciais contra o Estado e não vamos perdoar nem um centavo de juros. Nem que o Estado leve 100 anos a pagar aquilo que deve"

(Ler mais: http://aeiou.expresso.pt/-marinho-pinto-processa-estado=f676136#ixzz1ZUnL7ZPV)

No entanto, em campanha eleitoral disseste:
«Este tipo de acções contra o Estado são absolutamente inúteis e qualquer advogado deve saber isso, porque se tivesse alguma utilidade já a Ordem o tinha feito. Uma acção destas demora anos e se alguns advogados querem esperar anos para que o Estado lhes pague então muito bem»,


Certamente compreenderás a minha confusão.

P.S. - Tomei conhecimento das tuas visitas a Timor nas quais te comprometeste a dar formação aos advogados timorenses em Portugal e a ajudar na criação de uma Ordem dos Advogados nesse País.
Duas questões:
1 - Essa formação também abrange os portugueses? É que já estamos à espera há muito tempo.
2 - Essa Ordem dos Advogados vai ser como a nossa tem sido ou vai ser uma a sério?

Abraço,

L.O.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

As meias-verdades do Marinho


Ora viva, Marinho


Bem, vou começar por responder à tua crónica no Jornal de Notícias chamada Estágio de Advocacia.
Nela somos brindados com mais umas daquelas interessantes manipulações de factos a que já nos habituaste.

Começas tu por dizer o seguinte: "Agora, o provedor insurgiu-se contra os artigos 24.º, 36.º e 42.º do RNE (já em vigor aquando do primeiro pedido de inconstitucionalidade) que impedem os candidatos de se inscreverem indefinidamente em cursos de estágio, mesmo depois de fazerem dois estágios e de reprovarem quatro vezes no mesmo exame. Com efeito, o que aqueles artigos determinam é que os candidatos que reprovarem num exame poderão repetir esse exame e se voltarem a reprovar terão de frequentar outro curso de estágio. Mas, se no fim deste novo estágio voltarem a reprovar mais duas vezes, então só poderão inscrever-se em novo estágio após um período de três anos."

Ora bem, isto induz claramente em erro o leitor menos informado.

Permite-me, então, explicar-te como as coisas se passaram, caso ainda não o saibas:

De facto foram feitas várias queixas ao Provedor de Justiça, com o intuito de submeter à apreciação do Tribunal Constitucional a eventual (in)constitucionalidade das normas constantes dos arts. 24.º, n.º 4, 36.º, n.º 2, 2.ª parte, e 42.º, n.º 5, 2.ª parte do Regulamento Nacional de Estágio, nas quais, em síntese, se diz que "o advogado estagiário que não passe à fase complementar, na sequência da repetição da fase de formação inicial, ficará impedido de se reinscrever em novo curso de estágio pelo período de três anos."

Contudo, esqueceste-te de dizer que, nas queixas apresentadas, se contestava também a inexistência de um exame de recurso para quem reprovasse numa das provas que compõem o exame de aferição (para isto basta veres a resposta da Provedoria de Justiça enviada aos reclamantes e que se encontra aqui).

Ou seja, as queixas apresentadas ao Provedor de Justiça incidiam sobre as seguintes três questões:
a) Obrigatoriedade da repetição da totalidade dos três testes escritos que formam a prova de aferição, em caso de reprovação apenas num deles ou em dois;
b) Fixação das taxas de €700 e €650, nos termos da Deliberação 855/2011, de 30 de Março, em substituição das quantias unitárias de €50, nos termos indicados nos n.ºs 2.1.2 e 2.1.3 da Tabela, e, em particular, a sua aplicação ao I Curso de Estágio de 2011, que se terá iniciado em 15 de Março p.p.;
c) Impossibilidade de reinscrição em estágio, pelo prazo de três anos, por parte do candidato que não tenha obtido sucesso, posto que reiterado, em diversos momentos estabelecidos no Regulamento.

Sucede que apenas a última das questões foi submetida pelo Provedor de Justiça ao Tribunal Constitucional. (Os motivos para a não sujeição das outras duas questões foram, quanto à primeira, a inexistência de inconstitucionalidade e, quanto à segunda, a situação de pendência de um processo urgente sobre essa mesma matéria.)

Portanto, nós começámos por contestar a situação do Advogado-Estagiário que reprova num dos três exames e é obrigado a repetir a primeira fase - uma vez que, à data, e da leitura da lei, decorria que não existiria época de recurso e só posteriormente, sim, contestámos a impossibilidade de reingresso no estágio após reprovação em duas primeiras fases.

No entanto, com os dados disponíveis à data, a reprovação em duas primeiras fases consistiria na mera reprovação num exame em cada curso, uma vez que, da leitura da lei, decorria que não existiria exame de recurso.

Resumindo e por tópicos para perceberes:
1 - Nós queixámo-nos, antes de mais, por não haver exame de recurso - isto é, por ser suficiente a reprovação (por uma só vez) num dos 3 exames para se ter de repetir a primeira fase.
2 - Posteriormente, no dia 1 de Julho de 2011, a CNA emitiu um comunicado (cfr. ponto 11 do comunicado - o qual, curiosamente, desapareceu da página da OA) a esclarecer a deficiente elaboração do Regulamento, assim permitindo a existência de um exame de recurso.
3 - Simultaneamente, contestámos a constitucionalidade das normas que determinam a proibição de reingresso no estágio por um período de 3 anos após a reprovação em dois cursos de estágio.
4 - Só este último pedido teve procedência.
5 - Mas à data da apresentação da queixa, bastava a reprovação num exame para a repetição da primeira fase, juntamente com a reprovação num outro exame no curso de estágio subsequente para ficar vedado o reingresso na OA por um período de 3 anos.
6 - Portanto, à data, a queixa foi apresentada, tendo como base o facto de a reprovação em dois exames (e não em quatro) ser suficiente para vedar o acesso à OA por um período de 3 anos.
7 - Em todo o caso, e mesmo que o candidato a estagiário tivesse chumbado 20 vezes, não caberia à OA limitar o seu reingresso na profissão, mas antes à ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA (neste ponto remeto para a leitura do acórdão do TC que declarou a inconstitucionalidade do exame de acesso).

Segundo ponto:

Prosseguindo na tua crítica ao Provedor de Justiça, dizes na mesma crónica o seguinte: "Isso apesar de se manter mudo e quedo em relação ao facto de o Estado não permitir que os licenciados em direito acedam à magistratura, justamente por reconhecer que as actuais licenciaturas não possuem a qualidade suficiente para possibilitar a formação de magistrados com qualidade"

Como já tive ocasião de referir, isto não faz sentido e é uma manifesta "treta".

Em primeiro lugar porque, se esta lógica procedesse, então faria sentido que fosse exigido o Mestrado em Direito para o ingresso no Centro de Estudos Judiciários, o que, efectivamente, não acontece [cfr. art. 5.º, al. b) da Lei n.º 2/2008]. ´

Veja-se, a este título, o que consta da secção de FAQs do CEJ:

"2 – Além desses requisitos, que outros tem de possuir quem pretende candidatar-se pela «via da habilitação académica»?
R: Quem puder candidatar-se apenas pela «via da habilitação académica» ou optar pela candidatura por esta via, tem ainda de possuir o grau de mestre ou doutor ou equivalente legal, salvo se for licenciado(a) em Direito ao abrigo de organização de estudos anterior ao estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março, ou equivalente legal, ou seja, se for licenciado em Direito «antes de Bolonha» (cf. nº 1 do art. 111º).
Os graus de mestre ou doutor dizem respeito a qualquer área científica, não exclusivamente a Direito. E também é indiferente, do ponto de vista da avaliação do preenchimento deste requisito, que esses graus tenham sido obtidos «antes» ou «depois de Bolonha».

Se o Estado estivesse a questionar a qualidade das licenciaturas (como queres vender), então faria sentido que exigisse o Mestrado em Direito. Contudo, não o exige.
Basta uma licenciatura em Direito e um Mestrado, por hipótese, em Estudos Africanos para ingressar no CEJ, sendo, por isso, suficiente a formação jurídica da licenciatura.

Eis a interpretação que faço deste normativo. Novamente por tópicos porque parece que se for um texto comprido não lês e eu estou farto de escrever sempre o mesmo:
1 - Antigamente o CEJ exigia um período mínimo de 2 anos entre a conclusão da licenciatura e o ingresso na formação como magistrado.
2 - O que significava que, nesse período, alguns dos melhores licenciados concluíam o estágio de advocacia e ficavam nessa profissão.
3 - O CEJ perdia bons profissionais.
4 - No entanto, tratava-se de um requisito que se prendia com a exigência de uma certa maturidade para o ingresso na magistratura e que, geralmente, está associada à idade.
5 - Presumia-se que, quem acabasse a licenciatura com 23 anos, deveria esperar 2 anos antes de ingressar no CEJ. Quiçá para adquirir alguma experiência prática jurídica e de vida.
6 - Chegou Bolonha e com ela os licenciados de 22 anos.
7 - Chegou a hora de reformar o ingresso no CEJ.
8 - Mas também a hora de corrigir o erro do passado e de não deixar fugir os melhores.
9 - Exige-se o Mestrado.
10 - Assim mantém-se a exigência de um período de dois anos entre a conclusão da licenciatura e o ingresso no CEJ.
11 - Simultaneamente, permite-se que os licenciados vejam o mestrado como uma extensão da licenciatura e optem por não entrar logo no mercado de trabalho ou, caso o façam, por ingressarem a meio tempo, juntamente com os estudos.
12 - Isto permite que os alunos concluam a licenciatura, ingressem no Mestrado, passem lá dois anos e, posteriormente, entrem no CEJ sem se "perderem" por outras vias.

Reconheço que é um bocado puxado, mas parece-me fazer mais sentido do que a tua teoria.

Abraço e beijinhos lá em casa

L.O.

P.S. - Já que não cumpres a Lei da Assembleia da República (quanto à abertura de cursos de estágio), podias ao menos cumprir os Regulamentos que aprovas, como seja o Regulamento da Comissão Nacional de Avaliação, designadamente:

Artigo 16.º
(Prazo de correcção)

1 — A correcção, classificação e publicação das notas das provas escritas nacionais terão de estar concluídas no prazo de trinta dias, após a realização do último dos testes, devendo as classificações ser objecto de prévia aferição pela CNA antes da sua divulgação.
2 — O prazo previsto no número anterior poderá ser prorrogado por deliberação do Conselho Geral.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Os exames da 1.ª fase



Olá Marinho,

Tenho evitado escrever-te para melhor poder desfrutar das curtas férias que um longo ano de primeira fase de estágio tardaram em trazer.
No entanto, antes que a letargia do calor e do conformismo me dêem a tradicional "marretada" na cabeça e me mergulhem nas profundezas do delicioso ócio cerebral que me congela a parte jurídica do cérebro, venho escrever-te uma última carta.
A carta, como não poderia deixar de ser, é dedicada aos exames de aferição realizados nos passados dias 18, 20 e 22 de Julho de 2011 (cujos enunciados se encontram aqui). Aqueles exames cujos resultados antecipas, qual vilão, enquanto acaricias lentamente um gato branco ao teu colo numa cadeira de cabedal que giras lentamente em direcção à tua secretária.

Por conveniência expositiva, abster-me-ei de repetir as minhas considerações prévias acerca do absurdo da existência de duas disciplinas por exame divididas em dois exames (um teórico e outro prático) com apenas um dia de intervalo.
Também não tecerei outras considerações acerca daqueles que se viram privados de realizar o exame de acesso porque as "inéditas" isenções de pagamento que proclamaste aos sete ventos mais não eram do que cenouras presas a canas de pesca que penduraste à frente daqueles membros da "manada" que menos posses têm.
Não... Ater-me-ei aos exames.

Dia 18 - Exame de Prática Processual Civil e Informática Jurídica

Da parte da manhã, nada de mais. Perguntas vagas e tecnicamente pouco precisas, mas nada de chocante. As revistas à legislação e a procura por cábulas numa já expectável tentativa de demonstração da superioridade moral da OA face ao CEJ.

Da parte da tarde surge o exame prático. Um caso prático feito "com rasteira". 10 valores dependentes da opção que tomássemos: processo executivo ou declarativo? Por um lado fomos advertidos de que o CNA era composto por membros do Porto e de Coimbra e que "sai quase sempre executivo". Por outro lado temos formadores a segredar aos ouvidos de alguns alunos durante os exames advertindo-os de que "não devem ir por aí", antes se deverão ficar pela via do processo declarativo. A resposta? Essa jaz no sagrado pergaminho dos critérios de correcção cuja divulgação permanece em suspenso até ao final das férias.

E as perguntas de prazos? Aquelas que motivaram a realização de duas sessões de formação (muito boas, por sinal) quase na véspera dos exames? Essas não existiram. Mas ainda assim foram distribuídos calendários aos formandos, quanto mais não seja para eles se entreterem a anotar os feriados e assim "queimarem" alguns minutos.

Dia 20 - Exame de Deontologia Profissional e de Informática Jurídica

Estudámos Informática Jurídica com base no que foi leccionado. Estudámos como pudemos para uma disciplina nunca antes leccionada e cujos formadores se opunham à sua sujeição a exame.
Focámo-nos no CITIUS e no SITAF, portais manifestamente mais importantes para a vida prática.
Em contrapartida fomos confrontados com a seguinte pergunta (com a cotação de 5v):
"O advogado B ficou encarregado de proceder ao registo de diversas alterações ao pacto social de uma sociedade por quotas, sua cliente, que tinha quatro sócios, com múltiplos actos, incluindo mesmo a transformação da sociedade em sociedade anónima.
Através do Portal da Empresa, conseguiu proceder a todos os registos necessários, mas, quando terminou, verificou que a acta da assembleia geral deliberativa do aumento de capital social e transformação da sociedade só estava assinada por três sócios.
Porém, tinha feito previamente a certificação de que a cópia da acta se achava em conformidade com o original constante do respectivo Livro de Actas, mas não reparara que a acta não estava assinada por todos os quatro sócios, ali dados como presentes.
A cliente estava com uma urgência enorme, por ter de apresentar certidão do novo pacto social num processo de financiamento bancário cuja falta podia implicar o fim a actividade comercial da empresa."

A matéria? Nunca foi sequer abordada nas aulas. A resposta? Alguns formadores não a sabiam dar no final do exame. As dúvidas colocadas pelos alunos? Essas obtinham respostas consoante o formador.

Dia 22 - Exame de Prática Processual Penal e Direito Constitucional e Direitos Humanos

Na véspera deste exame, pelas 14h12m, foi enviado aos estagiários do Conselho Distrital de Lisboa, o seguinte e-mail:

CDL


Ex.mos Senhores(as) Advogados(as) Estagiários(as)

Em virtude de termos recepcionado inúmeros e-mails e telefonemas esclarece-se o seguinte:


Não é permitida a utilização de comentários aos códigos. Apenas legislação anotada e comentada. Assim, não é permitido, entre outros, consultar no teste de amanhã o comentário ao Código de PP do Prof. Paulo Pinto de Albuquerque.


Boa sorte!



Dept. de Formação



Portanto, entendeu o CDL, num despacho manifestamente inepto, que não é permitida a utilização de comentários aos códigos, mas somente de códigos comentados.
Curioso acerca da diferença, telefonei para o CDL. Os esclarecimentos do Departamento de Formação foram no sentido de que o Código de Processo Penal anotado pelo Professor Paulo Pinto de Albuquerque era "um comentário ao código comentado" [sic], não obstante a referência, nesse mesmo código, de que se trata de um código anotado.

Contudo, às 15h35m, veio o mesmo Departamento de Formação remeter o seguinte e-mail aos advogados estagiários:

CDL


Boa tarde

Por favor dêem sem efeito e-mail anterior. O Código do Prof. Paulo Pinto de Albuquerque foi autorizado pela CNA.

Cumprimentos,

Dept. de Formação

--

Departamento de Formação
xxx@cdl.oa.pt

Rua dos Anjos, nº 79
1150 - 035 Lisboa

Tel. 21 312 98 50 . Fax. 21 353 40 57
www.oa.pt/lisboa

Ora, cumpre referir que muitos dos estagiários apenas adquiriram o CPP do Prof. Paulo Pinto de Albuquerque porque o mesmo lhes fora recomendado pelos formadores (sendo que o preço do mesmo ascende aos 99€).

Ao terem referido a notícia de que a sua utilização era proibida, e uma vez que estávamos na véspera do exame, vários estagiários dirigiram-se à livraria mais próxima e adquiriram um CPP (em cuja capa dissesse) anotado ou comentado. Escusado será dizer que esses mesmos estagiários não gostaram de receber a notícia de que, afinal, os primeiros códigos que compraram eram admissíveis e que tudo não passara de uma partida da OA para com os estagiários na véspera de um exame (o desagrado estendeu-se igualmente aos estagiários que realizaram o último exame escrito de agregação e que, esses sim, não puderam utilizar o referido livro).


Elabore uma sucinta exposição sobre os princípios comuns aos Direitos

Quanto ao exame em si, houve de tudo.

Destaco, porém, a questão n.º 4 da parte teórica cujo enunciado rezava o seguinte:

"Elabore uma sucinta exposição sobre os princípios comuns aos Direitos
Fundamentais, referindo-se, designadamente ao significado de cada um e à distinção entre ambos. (2V)"

Nesta questão houve formadores que entendiam tratar-se de princípios comuns aos Direitos Fundamentais e ao Direito Processual Penal (não obstante a inexistência de qualquer indício nesse sentido), bem como formadores que entenderam que por "ambos" o enunciado se poderia referir a 3, 4 ou 5 princípios diferentes, e não somente a dois. Isto porque as palavras têm o significado que os formadores ou os critérios de correcção lhes quiserem dar, podendo a palavra "ambos" reportar-se, se necessário, a dezenas de princípios e não somente a dois.


Para além dos erros técnicos nos enunciados, das (des)propositadas(?) ambiguidades nos enunciados, das revistas a legislação sem a presença dos seus proprietários, do desconhecimento da língua portuguesa por parte de alguns formadores, das opiniões discrepantes acerca das respostas acertadas que os mesmos partilhavam com os estagiários e da indesculpável deslealdade que rodeou a realização de toda esta 1.ª fase de estágio e, em particular, dos vergonhosos exames de aferição, resta-nos esperar pelo coup de grâce que virá com os critérios de correcção e com a publicação das notas.

Antecipo, desde já, o discurso do Bastonário aquando da publicitação das taxas obscenas de chumbos, onde certamente constará a referência à fraquíssima preparação técnica dos novos licenciados, à prostituição das faculdades e ainda o seu discurso auto-laudatório onde constará a referência à sua tentativa de limitação do acesso ao estágio com vista a seleccionar os melhores e com a tirania do Tribunal Constitucional que, ao proibir esse exame de acesso fez com que estes "medíocres" perdessem 6 meses das suas vidas a tentar entrar numa Ordem que não os quer.

As massas aderirão, os estagiários protestarão mas ninguém os irá ouvir. Os advogados apoiarão o Marinho e os que não apoiam, salvo honrosas excepções, remeter-se-ão à conversa de corredor e ao confortável silêncio que afirmam ser imposto pela "dignidade da profissão" mas que na verdade apenas esconde o receio de ser o foco da fúria irracional daquele que Manuel António Pina qualificou como "um camião sem travões".

O silêncio daqueles que preferem refugiar-se numa pretensa superioridade académica da qual não dão provas e que olham no sentido oposto para não terem de encarar a opressão dos futuros colegas - para quem olham como mera concorrência - é a prova de que a advocacia já não é digna, é um burgo. É a prova de que a salvaguarda da quota própria de mercado ultrapassou o estandarte da defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos a que os advogados estão vinculados e que proclamam servir. É a demonstração de que o Estatuto é um panfleto, os princípios são vento e o voto torna a lei facultativa para os eleitos.


Abraço,


L.O.


quarta-feira, 6 de julho de 2011

SubMarinho

Olá Marinho,

Hoje fiz uma pausa no estudo só para te escrever.

Antes de mais quero apresentar os meus agradecimentos pela prorrogação do prazo para o pagamento dos emolumentos. É verdade, disseste que quem não pagasse os emolumentos até ao dia 30 de Junho não fazia os exames e no dia 1 de Julho prorrogaste o prazo para dia 8. Muito útil.

No post anterior tive ocasião de fazer referência à Deliberação do Conselho Geral n.º 855/2011, de 11 de Março, relativa ao âmbito de aplicação da isenção do pagamento dos emolumentos (retroactivos) que criaste. Diz a referida deliberação o seguinte:

“3 - Ficam isentos do pagamento de taxas de emolumentos os estagiários que demonstrem, no acto de inscrição, que beneficiaram de bolsa de estudo, em todos os anos de frequência do curso de Direito, sem prejuízo da possibilidade de a Ordem dos Advogados reavaliar a sua situação económica por alteração superveniente.”

Para provar a carência da referida isenção, vieste tu requerer a junção ao requerimento correspondente de, pelo menos, 8 documentos. Felizmente requereste-o com 15 dias de antecedência para dar tempo a todos de os obterem com calma.

No entanto, os estagiários cumpriram as tuas exigências e, na sua maioria, vieram juntar os documentos todos que entendeste necessário.

Sucede que, como se os pressupostos da concessão de isenção não fossem já absurdos, a própria Ordem dos Advogados - pelo menos na zona de Lisboa - veio dificultar um pouco mais a sua aplicação.

Assim, mesmo os estagiários que (1) tenham auferido de bolsa nos 4 anos de licenciatura, (2) que tenham junto todos os documentos que queres e, no limite, (3) cuja situação económica não se tenha alterado, vêem agora os seus pedidos de isenção indeferidos.

Porquê? Porque a Ordem decidiu recorrer a critérios surpresa, que não tinha comunicado, e que, por mera coincidência, permitem excluir praticamente toda a gente que requereu a isenção.

Vejamos então a cronologia dos factos para quem tem a infelicidade de não ser rico:

1 - Em Dezembro inscreve-se no estágio mediante o pagamento dos 200 euros exigidos.

2 - A 15 de Março de 2011 inicia as aulas na Ordem dos Advogados.

3 - A 30 de Março de 2011, vem a descobrir que terá de pagar mais 650 euros até Julho (na verdade até 30 de Junho).

4 - No entanto, vê que preenche os requisitos para obter a referida isenção e trata de arranjar todos os documentos que pedes em 15 dias.

5 - a 29 de Junho de 2011 recebe a notícia de que afinal não tem direito à isenção e, como tal, terá de "desencantar" 650€ nos próximos 15 dias ou então não faz exame.

Curioso para quem apregoava no passado dia 21 de Junho (no Público) que "pela primeira vez na história da Ordem, as pessoas que estudaram com bolsas vão ter direito a um estágio gratuito".

Segue abaixo o despacho que uma parte considerável dos estagiários tem recebido. Sem prejuízo da existência de outros despachos de indeferimento que se baseiam na falta de documentos, entre outros que certamente existirão.

Enfim, vou voltar ao estudo de Deontologia.
Quem me dera que o problema posto no exame de Deontologia fosse tão fácil como aqueles com que a Ordem, designadamente tu, nos tem presenteado.

Abraço,

L.O.

P.S. - Pelo que percebi a concessão de bolsas não tem sido particularmente problemática na zona do Porto. Em contrapartida, na zona de Lisboa têm sido enviados despachos do teor do que se encontra acima.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Um medíocre é um medíocre

-se!!!


Olá Marinho,

Long time no see.
Tenho andado desleixado, é verdade.
Quando escreveste a célebre crónica do "Ioda-se" (vale a pena ler este maravilhoso pedaço de céu cronístico) acabei por nem comentar, apesar de estar inteiramente de acordo com o título que lhe puseste.

Deixei passar o facto de teres qualificado o Dr. Manuel António Pina, no dia 24 de Abril de 2011, como "um homem cruelmente dilacerado por indizíveis frustrações. É possível que na adolescência o tenham convencido de que seria um grande escritor, destino para o qual logo desenvolveu os tiques e poses apropriados. Mas, afinal, nunca passou de uma figura menor típica do universo queirosiano - um personagem que mistura o diletantismo de um João da Ega com os dotes literários de um Alencar d'Alenquer e o rancor mesquinho de um Dâmaso Salcede. Tudo isso, transposto para o jornalismo, resultou numa espécie de Palma Cavalão dos tempos actuais. Enfim, um homem que chegou a velho sem ter sido adulto e a quem os mais próximos, por rotina, caridade ou estupidez, provavelmente ainda tratam como uma grande esperança."

Esse mesmo Manuel António Pina que logo no mês seguinte foi galardoado com o Prémio Camões. Um prémio tipicamente atribuído a "megalómanos em permanente ajuste de contas com a sua própria mediocridade intelectual" e outras típicas figuras menores da escrita, como sejam Miguel Torga, Vergílio Ferreira, José Saramago, Sophia de Mello Breyner Andresen, Eugénio de Andrade, Jorge Amado, Agustina Bessa-Luís, etc.

Enfim, mais uma vez uma daquelas crónicas com observações pertinentes e acertadas a que tão bem nos habituaste.

Mas gostaria de atentar especificamente no seguinte excerto dessa crónica:

"MAP tem a postura de um medíocre bem pensante, para quem é sempre mais cómodo atacar pessoas em vez de criticar ideias. As pessoas arrumam-se de uma penada, atingindo-as, à falsa fé, com dois ou três adjectivos. Isso dá a essa espécie de cretinos uma ilusória sensação de importância. Os medíocres só se sentem fortes quando humilham os que julgam mais fracos. Discutir ideias ou comentá-las com seriedade é sempre mais difícil porque exige qualidades que não abundam em MAP. "

O que é, então, um medíocre para ti? Ousaria dizer, com base no excerto transcrito, que é alguém que faz uso da sua posição de superioridade para atacar aqueles que menos se podem defender... Ousaria acrescentar que é alguém que insulta em vez de discutir as ideias. Alguém cuja falta de qualidades o impede de retorquir na mesma medida em que lhe são apresentadas as discordâncias.

Pois bem, foi hoje divulgada a notícia de que alguns Advogados Estagiários solicitaram a adopção de uma providência cautelar ao Tribunal Administrativo de Lisboa com o intuito de impedir a aplicação daquele célebre despacho que aplica retroactivamente uma taxa.

Em resposta a essa reacção pela via judicial a um despacho que os Advogados Estagiários entendem como violador dos seus direitos, vieste tu proferir a marínhica (falta-me melhor adjectivo) afirmação: trata-se de "mero oportunismo de medíocres".
Rapidamente retornei ao teu texto do "ioda-se" para ver, segundo os teus critérios, porque motivo seríamos nós os medíocres.
1 - Quem é que se sente forte e tenta humilhar os que julga mais fracos? Serão os estagiários ou o Bastonário?
2 - Quem é que atinge as pessoas "à falsa fé", procurando arrumá-las de "uma penada" com dois ou três adjectivos? Foi quem recorreu à via judicial ou quem lhes chamou oportunistas e medíocres?
3 - Quem é que se recusa a discutir ideias ou comentá-las com seriedade? É quem processa e aguarda a contestação e uma decisão judicial ou quem insulta os autores da acção e não fundamenta a discordância?

Quem é que é medíocre?

Já agora, dizes ainda do MAP o seguinte: "Mas, ele é também intelectualmente desonesto, pois interpreta os factos sobre que escreve de modo que as pessoas concluam algo diferente do que eles realmente significam."
Ora bem, dizes tu na notícia referente à dita providência cautelar que: “pela primeira vez na história da Ordem, as pessoas que estudaram com bolsas vão ter direito a um estágio gratuito”.

Quem ler isto certamente pensará que estás a permitir que os alunos com insuficiência económica façam o estágio gratuitamente. Cabe-me, então, esclarecer essas pessoas:

Nos termos do § 2.º da Deliberação do Conselho Geral n.º 855/2011, de 11 de Março:

“3 - Ficam isentos do pagamento de taxas de emolumentos os estagiários que demonstrem, no acto de inscrição, que beneficiaram de bolsa de estudo, em todos os anos de frequência do curso de Direito, sem prejuízo da possibilidade de a Ordem dos Advogados reavaliar a sua situação económica por alteração superveniente.”


Quer isto dizer que só os alunos que tenham beneficiado de bolsa EM TODOS OS ANOS DA LICENCIATURA podem ficar isentos do pagamento destas taxas. Mas mesmo esses terão de provar perante a Ordem dos Advogados que entretanto a sua situação económica não se alterou (quiçá em virtude de lhes ter saído o Euromilhões).
E para tal, vieste tu enviar aos Estagiários o seguinte aviso:

"Solicita-se, assim, aos Senhores Advogados Estagiários que pretendam beneficiar de bolsa por insuficiência económica que o requeiram na Secção de Inscrições deste Conselho Distrital até ao próximo dia 15 de Junho, devendo para tal o requerimento ser instruído com os seguintes documentos, sem prejuízo de poderem ser solicitados outros pelos Serviços que se venham a revelar necessários perante a situação concreta:


- Documento comprovativo de ter beneficiado de bolsa de estudo por insuficiência económica durante todos os anos de frequência do Curso de Direito;


- Declaração do IRS relativa a 2009 e respectiva nota de liquidação, do próprio ou do(s) titular(es) do rendimento do agregado do qual o requerente faz parte;


- Declaração do IRS relativa a 2010 e comprovativo de recepção pela DGI, do próprio ou do(s) titular(es) do rendimento do agregado do qual o requerente faz parte;


- Documento emitido pela Junta de Freguesia da área de residência com a composição do agregado familiar, caso o(s) IRS apresentado(s) não forem do próprio requerente;


- Três últimos recibos de vencimento de trabalho dependente, os três últimos recibos verdes, os comprovativos dos últimos três meses do subsídio de desemprego auferido, os comprovativos dos três últimos recebimentos de pensões ou reformas, consoante o caso, do próprio ou do(s) titular(es) dos rendimentos;


- Declaração de início (ou de reinício) de actividade em sede de IRS;


- Declaração de cessação da actividade em sede de IRS, sendo o caso (não dispensa a apresentação da declaração de início/reinício).


A insuficiência económica deverá ser demonstrada pelo requerente a pedido dos Serviços, sempre que estes lho solicitem ou a Tabela de Emolumentos de Estágio preveja um pagamento."


Perguntar-se-á:

1 - E aqueles que só tiverem beneficiado de bolsa, por exemplo, em três dos quatro anos do curso?

2 - E aqueles que só tiverem beneficiado de bolsa num dos anos do curso?

3 - E aqueles cujos pais tenham ficado desempregados recentemente?

4 - E aqueles que simplesmente tenham visto a sua situação económica piorar?

5 - E aqueles que tenham beneficiado de bolsa nos quatro anos do curso e não tenham apresentado a documentação até 15 de Junho? Trata-se de uma hipótese muito provável, uma vez que este aviso chegou aos estagiários a 30 de Maio e a documentação que exiges só não inclui a cor da roupa interior.


Resposta: Pagam.


Caberá perguntar quem é que interpreta os factos sobre que fala "de modo que as pessoas concluam algo diferente do que eles realmente significam"?


Abraço,


L.O.

sábado, 2 de abril de 2011

O Absurdo




Olá Marinho,


Confesso que não foi com grande espanto que recebi a notícia do aumento dos emolumentos. Já tinha antecipado que viria alguma coisa do género e só estranhei ter demorado tanto.

Cada vez te preocupas menos com as aparências e já deixaste bem claro que o teu objectivo é chumbar a quase totalidade dos estagiários.
Depois desse chumbo - fazendo agora um juízo de prognose -, diria que não tardará a que venhas para as notícias dizer que estão todos mal preparados e que nada disto teria sido necessário se te deixassem manter o famigerado exame de acesso.
Poderás ainda dizer que era tua intenção evitar que os jovens entrassem na Ordem dos Advogados mal preparados e que querias evitar que perdessem 6 meses das suas vidas apenas para chumbarem. Porque tu querias apenas os melhores e ao ser declarada a inconstitucionalidade do exame de acesso, o que o Tribunal Constitucional conseguiu foi frustrar os sonhos e esperanças de tantos jovens... E tu, bonzinho, acataste a decisão apenas para depois se provar que tinhas razão...

Agora permite-me expor o meu ponto de vista, subscrito por alguns dos meus colegas estagiários.

I. Da marcação dos exames


Começaste, na alteração ao Regulamento Nacional de Estágio de 2009, por suprimir o elementar direito dos estagiários a repetição da prova em caso de chumbo, salvo nos casos de falta justificada. Pelo menos suprimiste a previsão expressa que constava do anterior regulamento.

Onde antes se lia:

Artigo 23.º
Repetição dos testes escritos da prova de aferição

1 — O advogado estagiário que falte justificadamente a todos ou
algum dos exames da prova de aferição ou em algum deles seja classificado com nota negativa poderá realizar novo teste escrito na área ou áreas a que faltou ou obteve insuficiência, por uma única vez, desde que se inscreva para o efeito no prazo de 15 dias úteis a contar da publicação da classificação inicial ou da decorrente da revisão da prova, sob pena de suspensão automática da inscrição.

Agora lê-se:

Artigo 23.º
Repetição dos testes escritos da prova de aferição

1 — O advogado estagiário que falte justificadamente a todos ou algum dos exames da prova de aferição poderá realizar, por uma única vez, novo teste escrito na área ou áreas a que faltou, desde que o requeira no prazo de 10 dias a contar da publicação da pauta de classificação, sob pena de suspensão automática da inscrição.


Portanto, o aluno que agora reprove num (dos seis) exame(s), terá de esperar que tu abras novo curso de estágio (o que, certamente, não será já este ano), para depois repetir a 1.ª fase toda e fazer novamente os exames. Sendo que nesta altura (aposto) a inscrição no estágio já estará sujeita ao novo Estatuto que entretanto há-de ser aprovado e que já deve prever a exigência de mestrado.

De seguida, marcaste 6 exames numa semana, organizados da seguinte forma:

- Dia 18 de Julho de 2011 (2.ª feira):
Exame de Prática Processual Civil e Exame de Organização Judiciária. Um de manhã (das 10h às 12h30), outro de tarde (das 15h às 17h.30).

- Dia 20 de Julho de 2011 (4.ª feira):
- Exame de Deontologia Profissional e Exame de Informática Jurídica - Um das 10h às 12h30m e outro das 15h às 17h.

- Dia 22 de Julho de 2011 (6.ª feira):
-Exame de Prática Processual Penal e exame de Direito Constitucional e Direitos Humanos - Das 10h às 12h30m e à tarde das 15h às 17h.

Não deixa de ser curioso se compararmos este mapa de exames, por exemplo, com o do último curso de estágio no Conselho Distrital do Porto:

12 de Setembro (sábado)

PRATICA PROCESSUAL PENAL (10.00h às 12.00h, mais ½ hora de tolerância)

16 de Setembro (quarta-feira)

DEONTOLOGIA PROFISSIONAL (15.00h às 17.00h, mais ½ hora de tolerância)

19 de Setembro (sábado)

PRÁTICA PROCESSUAL CIVIL (10.00h às 13.00h, mais ½ hora de tolerância)

Mas atenção: Para ti nós não temos 6 exames, temos, sim, 3 exames divididos em duas partes e duas matérias diferentes (basta ler o art. 20.º n.º 1 do RNE e que diz "1 — A prova de aferição é constituída por três testes escritos, cada um deles abrangendo duas matérias distintas." ).
Faz-me lembrar aquele episódio do Blackadder em que o Baldrick pensava que tinha visto uma vaca com duas cabeças e dois corpos, quando na verdade tinha visto duas vacas ao lado uma da outra.

Como se tal não bastasse, em cadeiras como Processo Civil, aumentaste o programa e diminuíste o número de horas de formação de 80 para 50.

Ah, e é verdade, pela primeira vez decidiste fazer um único Exame Nacional, em vez de vários exames organizados por cada Conselho Distrital. Assim, nem os formadores sabem o que sai no exame e nem tens de te preocupar se a matéria foi toda leccionada ou não: sai tudo.

(Ah, e já agora, não deixa de ser irónico como digas que não cabe à OA dar formação mas depois duplicas o número de cadeiras).

II. Da tabela de emolumentos

Agora vem a parte onde a Ordem conseguiu descer mais baixo que nunca.

Logo quando abriram as inscrições para a Ordem dos Advogados, todos nos inscrevemos e pagámos o valor de 200€, correspondente ao seguinte: 150€ a título de inscrição e 50€ a título de inscrição no exame final da 1.ª fase (embora lá diga do exame nacional de acesso ao estágio, o qual já não existe).
Tratava-se de um valor inferior àquele que era pago antes e que assim foi estipulado na célebre Deliberação n.º 2597/2009, onde se dizia (e atenção que esta é a parte engraçada), o seguinte:

"3. Considerando que durante o período de tempo em que o estágio decorre os Advogados Estagiários não auferem qualquer remuneração, ao contrário do que acontece com a maioria das profissões;

4. Considerando que a formação de um futuro Advogado deve ser exigente e rigorosa e de elevado sentido ético e deontológico, atento o exercício da Advocacia revestir interesse público e ser indispensável à defesa do Estado de Direito Democrático;

5. Considerando que o estágio deverá ser gratuito, num futuro que se deseja próximo, para aqueles que o frequentam;

6. Considerando que o acesso ao estágio da Advocacia não deve estar condicionado pelas limitações de ordem económica actualmente existentes;"

Isto foi, inclusivamente, uma das tuas bandeiras de campanha. Basta ver o teu Compromisso de Candidatura, onde dizes o seguinte:

"6 - Formação Gratuita
A formação dos Advogados deve ser tendencialmente gratuita. Os Advogados Estagiários são dos poucos candidatos a uma profissão que têm de pagar a sua formação. POu seja, não só não recebem qualquer subsídio como ainda têm de financiar a entidade formadora, ou seja, a Ordem dos Advogados. Isso não é justo. Assim, já que não recebem qualquer subsídio durante a sua formação, ao menos que esta seja gratuita. É o que iremos fazer."

Assim, numa atitude louvável de demonstração de compaixão pelos jovens em início de carreira, reduziste o custo do estágio.
Mas depois não abriste nenhum curso de estágio, apesar de a tal estares legalmente obrigado.

Depois, quando finalmente iniciaste o curso de estágio, a 15 de Março de 2011, bastante tempo depois de termos feito o pagamento daqueles valores, eis que surge a Deliberação n.º 855/2011, publicada em Diário da República no dia 30 de Março de 2011, a qual passou a impor o pagamento adicional de 700€ até à data dos exames da 1.ª fase, e o pagamento de 650€ até ao exame final de agregação.

Portanto, apregoaste a redução do preço de estágio, nós inscrevemo-nos com base na tabela de emolumentos publicada e pagámos o valor de 200€ e agora vieste impor um novo pagamento de 700€ a efectuar até Julho.

Em suma, a redução de preço que tanto enfatizaste, nunca existiu (ou melhor, existiu durante 15 dias).

Mais engraçado ainda... Vieste justificar esse aumento de preços, no preâmbulo da referida Deliberação n.º 855/2011, da seguinte forma:

"A) O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 3/2011, publicado na 1.ª Série do Diário da República, n.º 17, de 15 de Janeiro de 2011, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do artigo 9.º-A, n.º 1 e n.º 2, do Regulamento Nacional de Estágio da Ordem dos Advogados [referente ao Exame de Acesso ao Estágio] na redacção que lhe foi conferida pela Deliberação n.º 3333-A/2009, de 16 de Dezembro de 2009, do Conselho Geral da Ordem dos Advogados;

B) Tal declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, impede a Ordem dos Advogados de recorrer ao exame nacional de acesso ao estágio como forma de exigir aos candidatos a estágio profissional o domínio de conteúdos técnico-jurídicos indispensáveis ao ingresso nos cursos de estágio ministrados pela Ordem dos Advogados;

C) A melhoria do sistema de justiça obriga a que os advogados que nela participam, exercendo o patrocínio forense, se encontrem devidamente preparados nas vertentes técnico-jurídica e deontológica;

D) A boa administração da Justiça não exige apenas bons magistrados, mas também advogados com elevada preparação teórica e prática, a ponto de possuírem um domínio elevado dos conteúdos, substantivo e adjectivo, do direito;

E) A formação a ministrar aos candidatos no acesso à profissão de advogado deve observar um elevado padrão de exigência como resulta do novo regime da formação de advogados estagiários, plasmado no Regulamento Nacional de Estágio, na redacção que lhe foi conferida pela Deliberação n.º 3333-A/2009, de 16 de Dezembro de 2009;


"F) Tal como sucede com a formação dos magistrados, não deve ser a Ordem dos Advogados a suportar os elevados custos financeiros com a formação dos candidatos a advogado, dado o manifesto interesse público de que se reveste o exercício da profissão e o seu papel decisivo na boa administração da justiça;

G) Em resultado do novo modelo de formação, mais exigente, ínsito no Regulamento Nacional de Estágio aprovado pelo Conselho Geral, e, bem assim, do acesso ao estágio por parte de candidatos a advogados com menos de 5 anos de licenciatura, torna-se necessário adequar os emolumentos previstos na Tabela de Emolumentos e Preços, para a fase de formação inicial e complementar do estágio e para a inscrição como advogado;

H) Tal alteração deve ser de modo a que os custos do acesso à profissão, não sendo para já assumidos pelo Estado, como acontece no caso dos magistrados, sejam suportados por quem pretenda aceder à profissão e não pela Ordem dos Advogados;

I) A diferente realidade dos vários Conselhos Distritais, quer quanto ao número de estagiários, quer quanto às condições dos respectivos Centros Distritais de Estágio, quer quanto às acessibilidades, e, outrossim, a necessidade, por imperativo legal, de definir valores emolumentares uniformes para todo o país;"


Espantoso... Como as coisas mudam.

Depois da declaração de inconstitucionalidade do exame de acesso, agora já devem ser os jovens, aqueles coitados que antes querias ajudar, a pagar este valor absurdo do estágio (o valor mais alto de sempre).


Assim, depois de teres perdido no Tribunal Constitucional, vens impor que o estágio que antes apregoaste dever custar 300€, passe agora a custar 1550€. E como se tal não bastasse, vens impor que este valor se exija imediatamente aos já inscritos.


Portanto, aqueles que não tiverem dinheiro serão forçados a abandonar o estágio, enquanto aqueles que pagarem e continuarem, muito provavelmente irão chumbar e ser forçados a aguardar, no mínimo, mais um ano (até que abras novo curso de estágio), para depois pagarem mais 700€ para poderem fazer a fase inicial.

Assim, só o estágio dos Conselhos Distritais de Lisboa e do Porto renderá cerca de 2.170.000,00€ e isto sem contar com o pagamento dos recursos de revisão de prova.


Em suma, tenta-se reduzir o número de estágio com um exame ilegal e inconstitucional, como não se consegue:
a) Aumenta-se absurdamente o preço do estágio e impõe-se essa alteração imediatamente. Sim, porque assim os mais carenciados não podem entrar e logo aí acaba-se com o trabalho que aqueles pobres tão incómodos dão.
b) Duplica-se o número de disciplinas e aumenta-se o programa das já existentes.
c) Marcam-se os exames todos para a mesma semana.

Parabéns, Marinho.

Abraço

P.S.

Caríssimos colegas:

Unam-se e reajam. Reclamem, recorram, processem, protestem, manifestem-se mas não se fiquem.
A subserviência e a passividade só provam que ele tem razão e que não percebemos nada de Direito. A imposição desta nova taxa é ILEGAL.
Já estão a ser organizados grupos para decidir as vias por onde seguir, não esperem que sejam os outros a agir.



terça-feira, 22 de março de 2011

Carta em video

Olá Marinho,

Hoje tomei conhecimento das datas marcadas para os exames do final da 1.ª fase do estágio.

Nem vou tocar no facto de teres duplicado o número de cadeiras quando dizes que não cabe à Ordem dos Advogados ensinar Direito, mas sinceramente... 6 exames numa semana? 2 exames diários com apenas um dia de permeio?

Enfim, hoje estive a rever o grande "Monty Python and the quest for the holy grail" e apercebi-me de que a relação dos estagiários contigo é um pouco como o combate com o Black Knight.

Só ainda não percebi bem qual das partes é o Black Knight... Mas suspeito...


Abraço,

L.O.

sábado, 19 de março de 2011

Da exigência de Mestrado




Olá Marinho,

Tens vindo, com o passar do tempo, a tentar impor a obtenção do grau de mestre para o acesso ao estágio de advocacia.
Infelizmente era algo com que o candidato Fragoso Marques também concordava e que, sinceramente, não me parece fazer sentido.

Analisemos a tua argumentação:

Em primeiro lugar, dizes que os licenciados em Direito de Bolonha não têm qualidade. Pergunto-te, como é que sabes? Honestamente, que base tens tu para sustentar essa afirmação? Nunca te ouvi a fundamentar isso a não ser com o "não se pode aprender o mesmo que se aprendia em 5 anos com cursos de 4 ou 3". Então e os cursos de 4 anos pré-Bolonha? Também os havia, como sabes.
E já agora, quantidade de anos de estudo é sinónimo de qualidade? Nesse caso deves ter dos melhores cursos que para aí há. Especialmente quando tu próprio admites que faltavas às aulas e quase não estudavas.

Em segundo lugar, dizes que vais exigir o mestrado porque o CEJ também exige e não se deve exigir menos para um advogado do que para um juiz. Então pergunto:

a) Quando era exigido um período mínimo de 2 anos entre a conclusão da licenciatura e o ingresso no CEJ, também concordavas que se devia pedir o mesmo para a advocacia?

b) O CEJ exige o mestrado em qualquer área, não necessariamente em Direito. Mas tu queres exigir o mestrado em Direito. Então deve exigir-se mais aos advogados do que aos juízes?

c) Nunca te ocorreu que talvez esta exigência do CEJ tenha como fundamento, não uma especial necessidade de preparação, mas sim a vontade de ter magistrados mais velhos do que os que surgiriam com Bolonha e, consequentemente (embora não necessariamente), com mais maturidade?
A favor deste argumento temos:
c1) Não exigem mestrado em Direito, mas em qualquer área.
c2) Já antes se exigia um período de 2 anos antes de se entrar no CEJ (bem sei que estes dois são repetidos).
c3) Dir-me-ás: "Ah mas então porque é que o CEJ não exige mestrado para os licenciados anteriores a Bolonha?" Simples, meu amigo Bastonário, porque já não há licenciados anteriores a Bolonha há, pelo menos, dois anos.

Tu próprio disseste que os juízes não podem ser "miúdos de 26, 27 ou 28 anos". Mas nunca te ouvi (até á data, mas não me espantaria nada) dizer que os advogados também não podiam ser "miúdos" com essa idade.

Em terceiro lugar, ignoras que há tipos de mestrado diferentes.
Há faculdades que têm, por um lado mestrados científicos/académicos e, por outro, mestrados profissionalizantes, sendo que os primeiros demoram mais tempo a obter do que os segundos. Então pergunto:
a) É irrelevante qual dos mestrados se tira?
b) Sendo que há mestrados onde uma nota inferior a 14 valores na fase lectiva impede o acesso à tese. No caso de alguém não conseguir aceder à tese em virtude de ter tido, por hipótese, uma classificação de 13 valores na fase lectiva, dir-me-ás que essa pessoa não poderá vir a ingressar na O.A.?
c) Porque é que se deve exigir a conclusão de uma tese a um licenciado pós-Bolonha, quando não havia nenhuma exigência semelhante antes?

A única exigência que até admito que não extravase grosseiramente os limites da razoabilidade, embora não concorde com ela, é a exigência da conclusão da fase lectiva do mestrado, uma vez que essa fase tem a mesma duração em todos os mestrados que conheço - 1 ano.
Se queres um curso de 5 anos, então impõe essa exigência. Não faças é depender do acesso à O.A. a celeridade da leitura, agendamento e discussão da tese, especialmente no Mestrado Científico/Académico.

Senão, vejamos qual será o percurso de um licenciado até aceder à advocacia:
1 - 4 anos de licenciatura (não abordarei o curso de 3 anos porque, tanto quanto sei, só existe um em todo o país, embora tentes passar a mensagem de que são quase todos)
2 - 1 ano de fase lectiva do mestrado.
2.1 - 6 meses para a elaboração da tese no Mestrado Profissionalizante.
2.2 - 1 ano para a elaboração da tese no Mestrado Científico.
3 - Período entre 3 meses (sendo generoso) no Mestrado Profissionalizante e 1 ano no Científico, para leitura e discussão da tese.
4 - Período indeterminado a aguardar que abras o curso para a OA.
5 - 2 anos e meio de estágio na OA.
6 - Isto, presumindo que se passa à primeira e que marcas os exames na data certa, senão ascenderá a 3 anos.

Total:
Mestrado Profissionalizante: 8 anos e 3 meses entre o início do curso e o ingresso na advocacia.
Mestrado Científico: 9 anos e meio.

Não será muita gente capaz de estar tanto tempo a estudar e, na maior parte das vezes, sem ganhar, mas o que é que se há-de fazer?

E é por isto tudo que te quero congratular pelo teu discurso na Sessão de Abertura do Ano Judicial.
Não podia concordar mais contigo quando dizes:

“Hoje interrogo-me o que posso dizer aos meus filhos. O que é que a minha geração lhes deu? Desemprego, pobreza e dívidas, muitas dívidas e por isso concluo: as nossas elites falharam”.

Abraço,

L.O.