"A prestação do patrocínio forense não era a mesma coisa que o fabrico de bolas de Berlim ou a produção de alheiras"
António Marinho Pinto in "Um combate desigual", Verso de Kapa, 2010, p.46

terça-feira, 21 de junho de 2011

Um medíocre é um medíocre

-se!!!


Olá Marinho,

Long time no see.
Tenho andado desleixado, é verdade.
Quando escreveste a célebre crónica do "Ioda-se" (vale a pena ler este maravilhoso pedaço de céu cronístico) acabei por nem comentar, apesar de estar inteiramente de acordo com o título que lhe puseste.

Deixei passar o facto de teres qualificado o Dr. Manuel António Pina, no dia 24 de Abril de 2011, como "um homem cruelmente dilacerado por indizíveis frustrações. É possível que na adolescência o tenham convencido de que seria um grande escritor, destino para o qual logo desenvolveu os tiques e poses apropriados. Mas, afinal, nunca passou de uma figura menor típica do universo queirosiano - um personagem que mistura o diletantismo de um João da Ega com os dotes literários de um Alencar d'Alenquer e o rancor mesquinho de um Dâmaso Salcede. Tudo isso, transposto para o jornalismo, resultou numa espécie de Palma Cavalão dos tempos actuais. Enfim, um homem que chegou a velho sem ter sido adulto e a quem os mais próximos, por rotina, caridade ou estupidez, provavelmente ainda tratam como uma grande esperança."

Esse mesmo Manuel António Pina que logo no mês seguinte foi galardoado com o Prémio Camões. Um prémio tipicamente atribuído a "megalómanos em permanente ajuste de contas com a sua própria mediocridade intelectual" e outras típicas figuras menores da escrita, como sejam Miguel Torga, Vergílio Ferreira, José Saramago, Sophia de Mello Breyner Andresen, Eugénio de Andrade, Jorge Amado, Agustina Bessa-Luís, etc.

Enfim, mais uma vez uma daquelas crónicas com observações pertinentes e acertadas a que tão bem nos habituaste.

Mas gostaria de atentar especificamente no seguinte excerto dessa crónica:

"MAP tem a postura de um medíocre bem pensante, para quem é sempre mais cómodo atacar pessoas em vez de criticar ideias. As pessoas arrumam-se de uma penada, atingindo-as, à falsa fé, com dois ou três adjectivos. Isso dá a essa espécie de cretinos uma ilusória sensação de importância. Os medíocres só se sentem fortes quando humilham os que julgam mais fracos. Discutir ideias ou comentá-las com seriedade é sempre mais difícil porque exige qualidades que não abundam em MAP. "

O que é, então, um medíocre para ti? Ousaria dizer, com base no excerto transcrito, que é alguém que faz uso da sua posição de superioridade para atacar aqueles que menos se podem defender... Ousaria acrescentar que é alguém que insulta em vez de discutir as ideias. Alguém cuja falta de qualidades o impede de retorquir na mesma medida em que lhe são apresentadas as discordâncias.

Pois bem, foi hoje divulgada a notícia de que alguns Advogados Estagiários solicitaram a adopção de uma providência cautelar ao Tribunal Administrativo de Lisboa com o intuito de impedir a aplicação daquele célebre despacho que aplica retroactivamente uma taxa.

Em resposta a essa reacção pela via judicial a um despacho que os Advogados Estagiários entendem como violador dos seus direitos, vieste tu proferir a marínhica (falta-me melhor adjectivo) afirmação: trata-se de "mero oportunismo de medíocres".
Rapidamente retornei ao teu texto do "ioda-se" para ver, segundo os teus critérios, porque motivo seríamos nós os medíocres.
1 - Quem é que se sente forte e tenta humilhar os que julga mais fracos? Serão os estagiários ou o Bastonário?
2 - Quem é que atinge as pessoas "à falsa fé", procurando arrumá-las de "uma penada" com dois ou três adjectivos? Foi quem recorreu à via judicial ou quem lhes chamou oportunistas e medíocres?
3 - Quem é que se recusa a discutir ideias ou comentá-las com seriedade? É quem processa e aguarda a contestação e uma decisão judicial ou quem insulta os autores da acção e não fundamenta a discordância?

Quem é que é medíocre?

Já agora, dizes ainda do MAP o seguinte: "Mas, ele é também intelectualmente desonesto, pois interpreta os factos sobre que escreve de modo que as pessoas concluam algo diferente do que eles realmente significam."
Ora bem, dizes tu na notícia referente à dita providência cautelar que: “pela primeira vez na história da Ordem, as pessoas que estudaram com bolsas vão ter direito a um estágio gratuito”.

Quem ler isto certamente pensará que estás a permitir que os alunos com insuficiência económica façam o estágio gratuitamente. Cabe-me, então, esclarecer essas pessoas:

Nos termos do § 2.º da Deliberação do Conselho Geral n.º 855/2011, de 11 de Março:

“3 - Ficam isentos do pagamento de taxas de emolumentos os estagiários que demonstrem, no acto de inscrição, que beneficiaram de bolsa de estudo, em todos os anos de frequência do curso de Direito, sem prejuízo da possibilidade de a Ordem dos Advogados reavaliar a sua situação económica por alteração superveniente.”


Quer isto dizer que só os alunos que tenham beneficiado de bolsa EM TODOS OS ANOS DA LICENCIATURA podem ficar isentos do pagamento destas taxas. Mas mesmo esses terão de provar perante a Ordem dos Advogados que entretanto a sua situação económica não se alterou (quiçá em virtude de lhes ter saído o Euromilhões).
E para tal, vieste tu enviar aos Estagiários o seguinte aviso:

"Solicita-se, assim, aos Senhores Advogados Estagiários que pretendam beneficiar de bolsa por insuficiência económica que o requeiram na Secção de Inscrições deste Conselho Distrital até ao próximo dia 15 de Junho, devendo para tal o requerimento ser instruído com os seguintes documentos, sem prejuízo de poderem ser solicitados outros pelos Serviços que se venham a revelar necessários perante a situação concreta:


- Documento comprovativo de ter beneficiado de bolsa de estudo por insuficiência económica durante todos os anos de frequência do Curso de Direito;


- Declaração do IRS relativa a 2009 e respectiva nota de liquidação, do próprio ou do(s) titular(es) do rendimento do agregado do qual o requerente faz parte;


- Declaração do IRS relativa a 2010 e comprovativo de recepção pela DGI, do próprio ou do(s) titular(es) do rendimento do agregado do qual o requerente faz parte;


- Documento emitido pela Junta de Freguesia da área de residência com a composição do agregado familiar, caso o(s) IRS apresentado(s) não forem do próprio requerente;


- Três últimos recibos de vencimento de trabalho dependente, os três últimos recibos verdes, os comprovativos dos últimos três meses do subsídio de desemprego auferido, os comprovativos dos três últimos recebimentos de pensões ou reformas, consoante o caso, do próprio ou do(s) titular(es) dos rendimentos;


- Declaração de início (ou de reinício) de actividade em sede de IRS;


- Declaração de cessação da actividade em sede de IRS, sendo o caso (não dispensa a apresentação da declaração de início/reinício).


A insuficiência económica deverá ser demonstrada pelo requerente a pedido dos Serviços, sempre que estes lho solicitem ou a Tabela de Emolumentos de Estágio preveja um pagamento."


Perguntar-se-á:

1 - E aqueles que só tiverem beneficiado de bolsa, por exemplo, em três dos quatro anos do curso?

2 - E aqueles que só tiverem beneficiado de bolsa num dos anos do curso?

3 - E aqueles cujos pais tenham ficado desempregados recentemente?

4 - E aqueles que simplesmente tenham visto a sua situação económica piorar?

5 - E aqueles que tenham beneficiado de bolsa nos quatro anos do curso e não tenham apresentado a documentação até 15 de Junho? Trata-se de uma hipótese muito provável, uma vez que este aviso chegou aos estagiários a 30 de Maio e a documentação que exiges só não inclui a cor da roupa interior.


Resposta: Pagam.


Caberá perguntar quem é que interpreta os factos sobre que fala "de modo que as pessoas concluam algo diferente do que eles realmente significam"?


Abraço,


L.O.